Achar o fio à meada

Este é o titulo de uma reportagem da jornalista Ana Pago para a Noticias Magazine. Tive o prazer de participar e estou por lá muito bem acompanhada. É giro ver como o tricot está a evoluir em Portugal, a ganhar mais voz, mais mãos e até a conquistar o homens!

O artigo completo está disponível aqui, e vale mesmo a pena ler. Mas, além do que aparece no artigo eu falei um pouco mais com a Ana. Acho que publicar aqui a entrevista na integra é uma excelente forma de nos conhecermos um pouco melhor, por isso aqui vai:

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– Nome? Idade? Formação/profissão?

Chamo-me Filipa Carneiro, tenho 33 anos e na web sou mais conhecida como “Nionoi” (o nome do meu blog). Sou engenheira civil de formação, mas artesã de nascença e de coração.

– O tricot é atualmente uma ocupação a tempo inteiro? Que espaço ocupa na sua vida e como o concilia com o resto? Como é que tudo começou para si?

Não consigo precisar quando tudo começou…sempre esteve presente na minha vida. Ainda muito pequena já gostava de apanhar os retalhos de costura da minha mãe e fazer roupas para as bonecas. E era sempre um prazer sentar-me ao lado da minha avó a fazer crochet. Estas atividades sempre ocuparam um espaço importante na minha vida, em paralelo com os estudos e, mais tarde, com a agitada vida de direção de obras. Com o nascimento da minha primeira filha, em paralelo com os problemas de desemprego dos últimos anos, a engenharia foi ficando para trás e as agulhas foram ganhando terreno. Naturalmente fui aprendendo cada vez mais, aprofundando conhecimentos e experimentando novas técnicas. Por incentivo de uma amiga dei o primeiro workshop e descobri que ensinar pode ser um enorme prazer. Quase sem dar conta, comecei a dar aulas de tricot praticamente a tempo inteiro sendo esta a minha principal ocupação, hoje em dia.

– Como se explica que o tricot seja hoje uma tendência tão marcante quando, ainda não há muitos anos, não se via com bons olhos que uma mulher cosmopolita tricotasse? O que mudou entretanto?

Não acredito que tenha sido uma mudança em específico, foram várias. Por um lado, a crise levou muitas mulheres a ficarem em casa e procurarem novas ocupações, por outro lado, a tendência crescente de recuperar tradições e a valorização do trabalho artesanal, marcam o regresso do tricot às nossas vidas. Além disso, não posso ignorar a forte influência internacional, com novos designers de tricot cheios de trabalhos modernos e divertidos que nada têm a ver com os tradicionais tricots da avó. E, este último fator é, a meu ver, determinante na atração das gerações mais jovens. Hoje uma jovem disfruta a tricotar a sua própria camisola, é quase visto como uma afirmação – uma peça de vestuário única, exclusiva, de qualidade e mais “green”.

 – Em que é que se inspira para criar? Que peças costuma fazer?

As inspirações são várias, mas sobretudo o atrativo por tentar novas técnicas, novas construções. Em cada projeto procuro sempre tentar uma coisa nova, mesmo que seja só um pormenor de acabamento, ou uma nova forma de remate. Tricoto sobretudo para a minha filha e para oferecer. Este ano tentei contrariar essa tendência, prometendo tricotar mais para mim….não consegui! Acabei de ser mãe novamente e as agulhas estão cheias de roupa para o pequeno!

– Qual a que mais gozo lhe deu a tricotar até à data? Alguma história especial associada a essa em particular?

Os primeiros vestidos que tricotei para a minha filha foram muito especiais, têm um valor sentimental muito grande porque foram tricotados “em cima da barriga”. Aliás, ela nasceu no dia seguinte a eu terminar a manta que faltava no seu enxoval. Uma coincidência talvez, mas que deixa as peças cheias de boas memórias e lhes conferem uma “alma” muito especial.

– Quanto tempo leva, em média, a conceber e confecionar cada uma? Quais as maiores dificuldades, de um modo geral?

Às vezes o que leva mais tempo é a escolha do modelo! Regra geral, se optarmos por um modelo existente, seguimos o esquema (as instruções) e o processo é bastante rápido. Mas se optarmos por desenhar o nosso próprio modelo o processo pode arrastar-se por muitos dias. Temos de experimentar, tricotar, desfazer, voltar a tricotar e fazer contas, muitas contas! A maior dificuldade das iniciantes do tricot é mesmo esta resistência a tricotar as instruções à risca. Querem logo desenhar a adaptar as peças ao sabor da sua imaginação e isso pode ser muito trabalhoso e levar até a alguma frustração, quando o resultado final não corresponde ao que haviam imaginado. As tricotadeiras mais experientes são, normalmente, mais sensatas e seguem os esquemas quase na íntegra.

– Que técnicas existem ao certo e quais as mais correntemente utilizadas?

No tricot existem quase tantas técnicas quanto tricotadeiras! Porque todas nós temos uma forma diferente de trabalhar, seja na forma como seguramos a lã ou como formamos as malhas. Mas de uma forma geral existem 3 técnicas: a portuguesa (com a lã a passar á volta do pescoço), a inglesa (com o fio de lã segurado na mão direita) e a continental (com o fio de lã segurado na mão esquerda). Aqui em Portugal a mais comum é, claro, a técnica portuguesa com o fio á volta do pescoço. Mas encontro também muita gente que tricota à inglesa e as tricotadeiras mais jovens preferem a técnica continental por ser a utilizada nos estados unidos e, por isso, com mais conteúdos disponíveis na internet.

– E em relação aos materiais: temos uma boa oferta no país? Onde costuma comprar os seus?

Temos uma excelente oferta no país e que tem vindo a crescer, tanto em quantidade como em qualidade. Além das retrosarias tradicionais começamos a ter lojas totalmente dedicadas ao tricot onde, além de fios e agulhas de grande qualidade podemos disfrutar de um atendimento personalizado e aulas específicas.

Em Lisboa tenho de recomendar a “Tricot das 5” porque além dos materiais de excelente qualidade e das aulas de tricot (comigo!), podemos aproveitar o salão de chá e ficar para um convívio a trocar ideias com outras tricotadeiras. No Bairro de Alvalade, gosto de visitar a “Artimoda” que é das poucas lojas que ainda vende fios ao peso e muitos adequados para tricotar à máquina, tudo isso acompanhado pela incrível simpatia da dona Paula que nos recebe sempre com um sorriso.

No Porto recomendo a “Ovelha Negra” recheada de fios apetitosos e uma agenda cheia de excelentes workshops adequados a todos os níveis. E a “Lopo Xavier”, na Praça Carlos Alberto, que continua a comercializar a sua marca própria de fios, em 100% lã virgem e de qualidade excecional.

– O que é preciso para alguém começar a tricotar? É uma arte fácil de aprender? E uma ocupação cara ou, pelo contrário, acessível a todos quantos queiram aventurar-se neste universo?

Começar a tricotar é muito simples! A técnica base é bastante simples e o que defendo é que deve ser o tricot a adaptar-se á tricotadeira e não o contrário. Ou seja, se não está a conseguir com o fio no pescoço, tente com o fio na mão; se não gosta de entrelaçar a lã nos dedos, tente então enrolá-la no polegar. Não tenha medo de ajustar a técnica a si, à forma que lhe parece mais natural segurar nas agulhas ou no fio. O resto é prática: quanto mais tricotar, mais bonito vai ficar o ponto. E, não desmoralize porque o aspecto algo irregular de uma peça tricotada à mão faz parte do seu caracter especial!

Quanto à economia, para começar é muito barato: umas agulhas + um novelo de lã custam menos de 10€ e já garantem umas horas de diversão! Depois pode ser tão caro quanto o seu bolso permitir. Pode optar por fios mais económicos ou deixar-se levar pelos luxos de uma meada fiada e pintada à mão… Só não vale poupar nas agulhas, elas vão acompanhá-la muitos e bons anos e vale a pena investir em produtos de qualidade.

Outras entrevistadas também partilharam as suas entrevistas completas, podes ver aqui a da Rosa Pomar e aqui a da Vera João Espinha.

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